Em Julho de
2009, uma série de neurocientistas juntaram-se em dois consórcios para lançar o
Projeto Conectoma Humano, inspirados
no bem-sucedido Projeto Genoma Humano.
Um consórcio envolve a Universidade de Washington em São Luís e a Universidade
do Minesota, num projeto por cinco anos com um investimento de 30 milhões de
dólares. O outro envolve o Massachusetts General Hospital da Universidade de
Harvard e a Universidade da Califórnia em Los Angeles, por três anos com um
investimento de 8,5 milhões de dólares.
Conectoma é uma palavra recentemente inventada a
partir da sua semelhança com o Genoma,
sendo que no caso do Conectoma
trata-se de decifrar a arquitetura da substância branca do cérebro que tem a
ver com a conectividade do cérebro. São ao fim ao cabo os circuitos que nos
fazem sentir e pensar. Assim, o objetivo do Projeto
Conectoma Humano é traçar um atlas das conexões cerebrais.
Efetivamente o
avanço tecnológico na área da neurociência não pára, e agora os neurocientistas
dispõe de tecnologia que lhes permite mapear as conexões cerebrais com maior
precisão. Dispõem agora de uma Ressonância
Magnética de Difusão, que é 4 a 8 vezes mais potente que os até aqui
sistemas convencionais. Tem a ver não só com a qualidade da resolução espacial
tridimensional, como também com a velocidade de captação, uma vez que os
circuitos funcionam a velocidades do milésimo de segundo. É um processo que
basicamente utiliza a passagem da água marcada com metais pesados através dos
axónios. Os cientistas começam por estudar voluntários saudáveis, mapeando a
arquitetura anatómico-funcional de certas redes, cuja finalidade última é
atacar certas doenças como o autismo, a esquizofrenia, a doença de Alzheimer, e
muitas outras.
Um dos grandes
entusiastas deste projeto é Sebastian Seung, Americano de origem Coreana, filho
de um filósofo, T.K. Seung, e professor de Neurociência Computacional no MIT. É
um grande dominador das três áreas do conhecimento que se entrecruzam –
neurociência, física e bioinformática. O departamento onde trabalha dá pelo
nome de Departamento do Cérebro, Ciência
Cognitiva e Física.
O Projeto do Conectoma Humano é um projeto
que enfrenta dificuldades mil vezes mais difíceis do que foram as dificuldades
do Projeto Genoma Humano. Mas sendo uma quase impossibilidade, mapear toda a
conectividade do cérebro, no princípio do Projeto Genoma Humano também havia
o mesmo ceticismo, e no entanto, o objetivo foi concretizado. Cada parte é
marcada para depois ser visualizada por microscopia eletrónica, cujas imagens em 3D coloridas são
construídas por potentes computadores. As cores vêm dos
metais pesados. Não é necessário ter todo o conectoma
mapeado para começar a beneficiar quem sofra de algumas doenças. Por isso, os
neurocientistas também estão otimistas, embora estimativas atuais apontem para
um ou dois séculos, até se chegar ao fim do mapeamento de todos os
circuitos cerebrais. Claro que continuarão a persistir certas questões que já se discutem desde Platão, para as quais o conectoma não terá resposta.
Afinal, tal como
aconteceu com o Genoma Humano, os mapas arquitetónicos não dizem tudo. E em
relação à mente humana a questão ainda é mais difícil: “Como emerge a mente
humana?”. A plasticidade do tecido nervoso é muito grande, e a arquitetura é
tão individual tal como é única a experiência de vida de cada um. Mesmo dois
gémeos homozigóticos terão conectomas
diferentes. Aliás, é o que se passa com as impressões digitais. Nem estes gémeos
têm impressões digitais iguais. Assim como o genoma é algo mais do que a mera justaposição de genes, também o conectoma
é algo mais do que as simples ligações neuronais e toda a sua arquitetura de
ligações. É o que alguns cientistas muito bem dizem: “o conjunto é mais do
que a soma das partes”. Mas o fundamento do conectoma
é precisamente dar o padrão das interações dinâmicas que correspondem à
cognição humana.
Mas voltando um
pouco ao princípio, o conectoma
corresponde mais à substância branca do que à substância cinzenta. Estes termos
eram designações clássicas da massa do cérebro, sendo que a mais falada era a
massa cinzenta. É conhecida a expressão popular: “este indivíduo tem boa massa
cinzenta”, para se referir que ele é inteligente. Todo o sistema nervoso
central tem massa cinzenta, que corresponde às camadas onde estão situados os
corpos das células nervosas. Mas a substância branca só tem, praticamente, as
ramificações dos neurónios - axónios - e que se ligam às dendrites.
Os axónios são revestidos por uma membrana chamada mielina. É parecida com
a manga de plástico que envolve os fios elétricos. A brancura vem da mielina.
A bem dizer, no vivo, sobretudo a cinzenta, tem mais uma cor rosada devido à
rede capilar sanguínea que irriga os neurónios. A substância branca é a região
das grandes comunicações, em que os axónios conectam as ramificações dendríticas à volta do corpo celular do neurónio. Por estimativa, com os axónios de um homem de 20 anos, se os
ligássemos todos em linha daria um fio com cerca de 176.000 km. Aos 80 anos
apenas daria para um fio de cerca de 100.000 Km.
Mapear o cérebro
todo em 3D pode dar trabalho e levar muitas décadas, mas vai ser possível
fazê-lo. Só para se ter uma ideia, os cientistas do Instituto Max Planck, na
Alemanha, ainda só conseguiram mapear uma rede de 100 neurónios do cérebro de outro animal. Ora, estima-se
que o cérebro humano tem cerca de 709 neurónios, e 1014 ligações
sinápticas entre axónios e dendrites. Cada neurónio pode estar ligado a cerca de mil
outros.